Horas de Frio: Cientistas descobrem mecanismo de percepção do frio na macieira
Descoberta de pesquisadores da Embrapa Uva e Vinho(RS) abre caminho para o desenvolvimento de macieiras que precisam de menos dias de frio para produzir. Eles descobriram o mecanismo de ação do gene ICE1 no processo de indução e superação da dormência da planta, etapa fundamental para garantir a produção dos frutos. De acordo com a hipótese dos cientistas, esse gene funciona como um gatilho térmico que, ao ser estimulado pelo frio, dispara uma cascata de respostas como a indução da dormência, processo fundamental para plantas originalmente de clima temperado florescerem e produzirem frutos.
“Esse processo é tão importante que instituições de pesquisa do mundo inteiro investem recursos em estudos para tentar entendê-lo”, frisa o pesquisador da Embrapa Luís Fernando Revers, responsável pela equipe que fez a descoberta. Ele explica que o controle genético da dormência em Rosaceae, família botânica à qual pertence a maçã, é um processo complexo e a identificação dos genes controladores é um grande desafio. “Podemos usar esse conhecimento para desenvolver novas cultivares com menor exigência de frio e continuar a produzir a fruta mesmo com o aquecimento percebido nos últimos anos”, esclarece.
Depois de identificar o gene responsável ICE1, a equipe da Embrapa Uva e Vinho criou uma um modelo hipotético explicando como ocorre o processo de indução e superação da dormência, etapa fundamental para garantir a produção dos frutos (veja vídeo abaixo). A ideia do projeto foi selecionar e estudar ao longo de sete anos duas populações segregantes de maçãs do Programa de Melhoramento Genético da Epagri, com diferentes períodos de brotação e floração, sendo mais tardias ou precoces. Nesse período, a pesquisa foi conduzida em duas etapas: genotipagem e fenotipagem. A etapa da genotipagem permitiu a montagem do mapa genético. Posteriormente, a integração dos dados de fenotipagem com o mapa genético levou à identificação dos locus associado ao período de brotação e o gene ICE1.
O cientista da Embrapa conta que a geração de cultivares adaptadas a cenários com menor disponibilidade de frio demanda avanços no conhecimento básico dos mecanismos biológicos de controle da dormência das gemas. “Apesar de se saber a respeito da ação de alguns fatores sobre o controle da dormência, ainda não se dispõe do conhecimento de como eles se inter-relacionam e o que pode ser classificado como causa ou consequência”, pontua o pesquisador Marcus Vinícius Kvistchal, que coordena o programa de melhoramento genético da macieira da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri), parceiro nas pesquisas da Embrapa Uva e Vinho. A equipe de Kvistchal irá testar na prática o uso conhecimento gerado no trabalho para o melhoramento de macieira.
Desenvolvimento acelerado de cultivares
O pesquisador da Epagri comenta que, caso a hipótese se confirme, a descoberta do funcionamento do ICE1poderá acelerar o processo de desenvolvimento de uma nova cultivar em até dez anos. “A descoberta irá possibilitar ações de melhoramento mais precisas e rápidas por meio da seleção assistida por marcadores moleculares”, prevê. O cientista explica que a partir de agora a seleção de uma nova cultivar com menor exigência de frio poderá ser feita assim que a semente germinar, dispensado a sua avaliação de desenvolvimento no campo.
Evelyne Costes, pesquisadora da área de Melhoramento Genético e Adaptação de Plantas Mediterrânicas e Tropicais (AGAP) do Institut National de la Recherche Agronomique (INRA), da França, considera a parceria entre Embrapa e INRA importante para enfrentar o desafio imposto pelas mudanças climáticas. “Espera-se que a expertise complementar de cada grupo beneficie muito a parceria, implementada desde 2016 por meio de um projeto conjunto chamado Dormap, que se beneficiou do financiamento da Embrapa e da Agropolis”, lembra.
Ela conta que o trabalho é organizado em três eixos científicos principais: a geração e troca de dados genômicos; a análise funcional de genes relacionados à dormência e a exploração da variabilidade genética para apoiar o melhoramento de plantas. Entre os resultados futuros, Evelyne destaca a elaboração de um acordo permitindo a criação do “Laboratório Internacional Associado”, a ser construído por meio de parceria entre as instituições, a fim de facilitar as visitas mútuas de pessoal (estudantes e pesquisadores) e a elaboração de novos projetos a serem financiados para apoiar as pesquisas.
Desenvolvimento acelerado de cultivares
O pesquisador da Epagri comenta que, caso a hipótese se confirme, a descoberta do funcionamento do ICE1poderá acelerar o processo de desenvolvimento de uma nova cultivar em até dez anos. “A descoberta irá possibilitar ações de melhoramento mais precisas e rápidas por meio da seleção assistida por marcadores moleculares”, prevê. O cientista explica que a partir de agora a seleção de uma nova cultivar com menor exigência de frio poderá ser feita assim que a semente germinar, dispensado a sua avaliação de desenvolvimento no campo.
Evelyne Costes, pesquisadora da área de Melhoramento Genético e Adaptação de Plantas Mediterrânicas e Tropicais (AGAP) do Institut National de la Recherche Agronomique (INRA), da França, considera a parceria entre Embrapa e INRA importante para enfrentar o desafio imposto pelas mudanças climáticas. “Espera-se que a expertise complementar de cada grupo beneficie muito a parceria, implementada desde 2016 por meio de um projeto conjunto chamado Dormap, que se beneficiou do financiamento da Embrapa e da Agropolis”, lembra.
Ela conta que o trabalho é organizado em três eixos científicos principais: a geração e troca de dados genômicos; a análise funcional de genes relacionados à dormência e a exploração da variabilidade genética para apoiar o melhoramento de plantas. Entre os resultados futuros, Evelyne destaca a elaboração de um acordo permitindo a criação do “Laboratório Internacional Associado”, a ser construído por meio de parceria entre as instituições, a fim de facilitar as visitas mútuas de pessoal (estudantes e pesquisadores) e a elaboração de novos projetos a serem financiados para apoiar as pesquisas.
Mais de 600 horas de frio
A macieira, assim como outras fruteiras de clima temperado, é induzida ao estado de dormência pelos primeiros frios do outono e a o inverno acumulando horas de frio para superar a dormência e retomar o crescimento na primavera. As cultivares dos grupos Gala e Fuji representam mais de 90% da produção brasileira e demandam em média de 600 a 800 horas de frio para superar a dormência e atingir uma produção sustentável. Segundo levantamentos da Área de Agrometeorologia da Embrapa Uva e Vinho, com base nos dados das Estações Meteorológicas do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), nos últimos cinco anos, a média das horas de frio (abaixo de 7,2ºC) da região de Bento Gonçalves (RS) ficou em 302 horas e nos Campos de Cima da Serra, em 561horas, ou seja, abaixo do considerado ideal para uma boa produção. Para compensar a exposição ao frio abaixo do ideal, a produção sustentável da macieira no sul do Brasil depende da aplicação de agentes químicos capazes de induzir a brotação.
Geada em São Joaquim na Serra Catarinense
Segundo acompanhamentos da equipe técnica é comum a ocorrência de perdas de produção atribuídas à insuficiência de acúmulo de frio durante o período de repouso hibernal e com as perspectivas das mudanças climáticas a produtividade poderá ser afetada.
De acordo com a Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM), hoje, além de atender o mercado nacional, a produção brasileira é responsável pela exportação anual de cerca de US$ 52 milhões em fruta fresca. Por isso, desde 2007 a equipe da Embrapa, em parcerias com universidades e institutos de pesquisa no Brasil e no exterior, vem concentrando esforços na temática, a partir da execução de diversos projetos de pesquisa (veja quadro abaixo).
Segundo Revers, depois de utilizar uma série de programas complexos que auxiliaram a fazer o mapa genético e da exploração da fenotipagem para identificação dos loci (regiões do DNA) associados à brotação/floração, o bolsista Tiago Sartor realizou uma inspeção visual detalhada no segmento de DNA da extremidade do cromossomo 9 e identificou o gene ICE1 na porção mais significativa do locus associado à brotação.
Descoberta ajudará melhoramento genético em todo o mundo
Ele conta que ao longo desse trabalho foram publicados diversos artigos sobre os avanços relacionados ao mecanismo da dormência e brotação nas macieiras e o grupo da Embrapa foi o único a identificar esse gene e a sua relação com o processo. “Achar o gene ICE1 foi crucial para elaborar a hipótese de como acontece indução da dormência e a brotação após o período invernal. Agora precisamos continuar e testar nossa hipótese na prática”, revela o pesquisador, que irá contar com a colaboração do INRA e da Epagri nessa nova etapa.
Melhoramento genético mais rápido
Kvistchal explica que se a hipótese for comprovada, o trabalho de melhoramento genético será mais rápido, possibilitando uma vantagem interessante. “Em vez de ter de esperar a nova seleção de macieira apresentar as características no campo, vamos poder fazer o teste logo que a semente germinar e, por meio da extração do DNA, avaliar o gene ICE1. Se tiver a marca, a seleção segue na avaliação e caso não tenha, já será descartada”, explica ele.
O pesquisador pondera que a descoberta será de extrema importância para todos os programas de melhoramento no mundo, especialmente para os interessados no desenvolvimento de novas cultivares mais adaptadas a regiões com menos frio, como é o caso do Brasil, garantindo maior agilidade e precisão na criação de cultivares. Nos 47 anos de existência do Programa de Melhoramento Genético da Maçã da Epagri, foram lançadas19 cultivares, sendo 15 híbridas e quatro seleções de mutações espontâneas.
Para Costes, do INRA, a descoberta contribuiu significativamente para o estudo do processo de dormência e controle genético em macieira. Ela considera que a equipe liderada por Revers confirmou a robustez da associação entre a data da brotação e o locus na extremidade do cromossomo 9, onde estão presentes genes como ICE1, FLC e PRE1. “As descobertas e a hipótese da brotação relatadas no artigo abrem novas perspectivas para a comunidade científica e para aplicações em fruticultura”, avalia ela.
Costes destaca que a descoberta não irá auxiliar apenas o setor produtivo no sul do Brasil, pois muitos outros locais sofrem com a redução da exposição ao frio, como regiões produtoras do Mar Mediterrâneo, por exemplo.
“Alguns dos genes que foram associados à data de brotação podem ser potencialmente usados em programas de melhoramento para obter novas variedades melhor adaptadas aos cenários climáticos presentes e futuros, no Brasil, mas também em diferentes países e para diferentes condições climáticas”, afirma a pesquisadora.
As pesquisas com macieiras
Durante uma inspeção visual o bolsista Tiago Sartor fez a descoberta – Foto: Viviane Zanella
Ao longo de 12 anos, pesquisadores da Embrapa, Epagri e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) vêm fazendo uma série de experimentos, coletas e observações sobre os mecanismos de controle da dormência nas áreas de genética molecular, melhoramento genético, modelagem e fisiologia vegetal. A preocupação principal foram os efeitos impostos pelas mudanças climáticas no planeta, que afetaram negativamente a pomicultura brasileira. Essas são algumas publicações desses trabalhos:
Banco de dados sobre dormência: o Apple Bud Dormancy Database (Apple BDDB) é um aplicativo para web que permite consultar uma base de dados de genes relacionados ao processo de dormência. Apresenta registros amostrais para os 57 mil genes de macieira a partir de oito experimentos comparativos, resultando em mais de 450 mil registros de níveis de expressão.